Revista Traços Nº 2

Ano 3 • Número 2 • maio 2020

Não parece sem consequências o fato de nosso segundo número da Revista Traços ter se formado a partir de, pelo menos, dois aspectos: primeiro, o tema, que nos surgiu pelas ressonâncias do debate sobre os três registros, os nós; segundo, o momento político que atravessamos e que estava em seu auge no momento de nosso Encontro Anual, no qual os trabalhos do ano foram apresentados e discutidos. Esta Revista pode ser mais bem aproveitada se nos atentarmos para esses dois pontos. De maneira mais ampla, podemos resumi-los e dizer que o Real nos fez furo e nos lançou ao trabalho. O tema árduo, por vezes complicado, do enlaçamento do Real, Simbólico e Imaginário, certamente nos fez esbarrar na conceituação do Real, sempre mais difícil e fugidio em sua definição. E a Política, em todas as suas dimensões? É sempre de Política que se trata, pois estamos às voltas com o que é da ordem do governável e do ingovernável. Diríamos que o que nos põe a trabalho é o que não tem governo nem nunca terá: essa, uma definição que, infelizmente, Lacan não tinha em mãos, e que vem da nossa pólis e pela boca de um de nossos poetas. O Real nos alcança desde dentro. Significa dizer que o Real não se traduz como sendo os acontecimentos da realidade externa, embora estes, certamente, possam nos dividir e furar nossa rede de significantes, redes simbólicas e imaginárias, provocando em nós o sem sentido, a angústia. O Real não tem decência nem juízo. Decência e juízo são do campo simbólico e nos auxiliam na vida à semelhança de uma rede de segurança. Falhando isso, estaremos em vertigem. O que não é exatamente um problema, embora devesse ser uma questão ou nos por em questão enquanto sujeitos. A Psicanálise tem, desde suas origens, certo fascínio por ele. Um dos nomes do Real é pulsão, pulsão de morte, um dos conceitos mais fundamentais na teoria de Freud. Ora, se o campo do humano, por excelência, é o da palavra, do simbólico, não importa menos o do Real. Apesar de ter sido causado pela palavra, ele também é causa da palavra, um entrelaçamento que a faz surgir em toda sua (im)potência e que nos faz produzir novos sentidos e novos significantes. Portanto, os trabalhos aqui publicados poderão ser lidos por essa vertente do que fez furo em cada autor. Lá onde nossos saberes não foram suficientes nem eficientes, lá onde nossa clínica interrogou a teoria, lá onde nossos laços se desfizeram, graças ao Real, ironicamente, graças a ele, pudemos produzir algo.

Esperamos que os textos causem também os leitores.

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